Capítulo
XI – Sobre Vida
Eu
pouco participei da vida de meus personagens depois daquele escurecer. Mas não
deixei de acompanhar de longe o que faziam com suas vidas. E não me assustei com
os acontecimentos que eu não governava. Porque eu não poderia criar por eles as
suas próprias estórias. Havia prometido narrar com algumas licenças poéticas e
não mudar os acontecimentos.
Júnior
acabou perdendo o sorriso fácil do rosto, estava virando um homem de feição
fechada, diligente e investigador. Tentava descobrir outros mundos dentro do
cinema, da literatura e de seus trabalhos em demasia, havia cansado do mundo.
Valentim em contrapartida, acabou se transformando em um homem realizado, em um
lugar que agora poderia chamar de seu. Ele havia deixado de navegar dentro de
sua própria incompreensão temporal, se tornando cada dia mais um homem centrado
e regular.
Valkíria
não deixou de ser submissa ao seu amor, havia achado alguém que a travava de
igual para igual, sem permissões ou amarras. Não deixou nenhum de seus valores
serem corrompidos, continuou sendo a grande mulher que sempre foi, a mesma
ruiva com pensamentos soltos e atitudes baseadas na sua singularidade. E Leo,
recuperou sua confiança. Havia amadurecido antes do tempo, perdido as
esperanças antes do tempo, sofrido antes do tempo, sempre sendo um homem das
coisas antecipadas. Sua arte o resgatava de sua própria miséria. E todo o amor
que tinha, era evocado sobre pinceladas rápidas em telas cada vez mais
coloridas e menos escuras. Passou a sorrir sem precisar de seus remédios. Amava
sem esperar o amor de volta.
Eram
um porta-retratos familiar sem vínculos genéticos, apenas vínculos afetivos. Uma
família baseada no amor e respeito mútuo, sem hierarquia de poder. Todos eram
pais, mães, tios, avós e filhos, em uma fotografia que nunca se deteriorou pelo
passado.
-
Você já pensou em tirar a sua própria vida? – perguntou Júnior para Leo.
-
Já. Mas isso sempre me assustou um pouco. Estar em um momento e não estar no
outro. Aquele punhado de sorrisos e coisas, que você não vai mais poder ter.
-
Eu já pensei em suicídio, de tantas formas. E acho que ainda não estou tão
recuperado do que aconteceu com meu pai. Nunca imaginei outra pessoa, que não
fosse eu, nesta situação. Uma corda no meu pescoço, um alimento estragado,
remédios para dormir. De todas as formas possíveis. Que fossem eficazes e não
envolvessem sangue.
-
Mas você tem a Valkíria, agora também o Valentim, e também eu...
-
Isso me assusta um pouco, tenho medo de ter que deixar vocês partirem um dia.
Acabam sendo meu porto seguro. Com vocês eu tenho alguma esperança ainda nas
coisas.
-
Que isso! Ninguém é tão perfeito e certo assim, mas ainda existem várias
pessoas que valem alguma coisa por aí...
-
Onde elas se escondem?
-
Não quero ver você desiludido com a vida! Eu quero ver o seu sorriso que é tão
bonito. Suas piadas engraçadas, e toda a sua maneira divertida de encarar os
fatos. É esse homem que quero ver... Você é bonito quando é leve. Isso é
apaixonante em você...
-
Como se eu fosse um homem apaixonante... E é tanta coisa que tenho dentro do
meu peito, dentro da minha cabeça... Tanta coisa que eu quero fazer, tanta que
eu posso mostrar para o mundo. Mas eu não consigo dar o próximo passo. Eu não
consigo fazer mais nada, só me perder.
-
Você consegue. Claro que consegue. E quem disse que um homem precisa disso tudo?
Se perder também tem seus méritos, você ao menos não ficou dando círculos no
mesmo lugar. Vamos, erga essa cabeça e não se preocupe mais com essas coisas
por hoje. Daqui a pouco Valkíria e Valentim chegam com nossas bebidas e
aperitivos. Só precisamos dar um pouco mais de risadas, falar coisas que não
fazem sentido, ouvir um pouco de música, e esquecer que existem situações para
serem resolvidas ou acabadas...
-
Precisava há um certo tempo falar tudo isso com alguém.
-
Estarei sempre aqui para lhe ajudar e lhe ouvir. Você não está sozinho nesta!
-
Posso lhe abraçar? Isso seria bom para mim agora...
-
Por que não? Um abraço não machuca e nem mata...
-
Eu amo a sua generosidade e a sua amizade...
Os
dois se abraçaram e ficaram no silêncio. O que não se silenciava, era a mente
de Leo, que repetia várias vezes as palavras “E eu amo você”. E dentro do
precipício em que acabava de entrar, pediu licença para Júnior e foi até o banheiro.
Ele precisava desabar e colocar para fora aquilo que mais doía dentro do seu
peito.
E
ele abriu a torneira da pia e não parou de chover entre aquelas quatro paredes.
Estava inundando seu apartamento recém decorado. Molhou o rosto e o iluminou
com um lindo sol. Os olhos azuis pareciam reflexos dentro de uma piscina, no
dia de verão em que faz quarenta graus na sombra. Estava no centro de seu
universo novamente.
Quando
saiu do banheiro Valkíria já estava na cozinha, colocando os salgados em um
pote, os molhos em outros, e Valentim ria retirando as bebidas das embalagens e
colocando-as no freezer. Júnior escolhia a primeira seleção de músicas do dia, também
com um sorriso tão grande e bonito. Esta então, acabou se transformando na
radiografia completa do corpo interno de Leo. Abriu um sorriso verdadeiro e não
forçado.
-
Comprei Doritos e molhos de todos os tipos. Pensei em fazer nachos, mas sei que
vocês não gostam.
-
Não é não gostar Valkíria... É só não apreciar o sabor – respondeu Valentim.
-
Eu até apoiaria a ideia, se nachos não tivessem pimenta – complementou Leo,
saindo do banheiro e indo em direção a sala.
-
Eu odeio seus nachos Valkíria.
-
Nossa Júnior. Odiar é um sentimento pesado...
-
Então detesto...
-
Não mudou muita coisa, mas tudo bem. Amanhã de meio dia, eu e Valentim temos
que contar uma grande novidade – disse Valkíria, mudando suas frases para um
tom mais misterioso.
-
Ai não! Começaram! Para quê ser assim? Por favor, aí ficamos a noite toda falando
sobre isso e mais nada, só falando sobre vocês. Gostam disso não é mesmo?
-
Gostamos sim. Quem tem brilho tem que brilhar. Mas sério, desta vez é sério
Júnior.
-
Não fala assim que fico assustado!
-
É coisa boa.
-
Melhor assim. Estou comemorando minha “solteiridão” novamente.
-
Oi? – disse Leo desentendido.
-
Uma mistura de solteiro com solidão Leo. Acabei de inventar esta palavra...
Inventar as coisas que não existem virou moda. E como bom modista que sou, eu
dito a lei.
-
Agora ficou mais compreensivo! – Leo sorriu para Júnior.
E
toda aquela intimidade criada entre os quatro, os faziam voltar quase sempre
aos mesmos assuntos, e terminar falando sobre os mesmos fatos e pessoas, como
em toda conversa de família. Valkíria ainda não havia perdido o hábito de falar
precipitadamente as coisas, e acabou revelando antes do esperado:
-
Estou grávida! Mas ainda não é de certeza...
-
Você está o quê? – perguntou Júnior para a irmã, para obter confirmação.
-
Estou grávida!
-
Como assim? Meus Parabéns!!! – disse Leo – Estou muito feliz por ambos...
-
Amanhã faremos o exame para ter uma conclusão mais precisa. Mas ao que tudo indica,
e aos inúmeros testes de farmácia, eu serei pai... – disse Valentim enfatizando
o que Valkíria acabava de anunciar.
-
Nossa, nem sei o que dizer... Meus Parabéns ou Boa Sorte? – disse Júnior em um
tom de humor e deboche.
-
Credo Júnior! Boa Sorte... – Valkíria demonstrou não gostar do comentário.
-
Gente, desculpa... Comentário desnecessário, eu sei... Mas e agora? Como vão
ser as coisas? Já pensaram um pouco? Valkíria estudando, Valentim fazendo o
mesmo...
-
Tempo é o que não vai faltar, Júnior. Isso é pouco perto da sensação de poder
fazer tudo dar certo com ele – respondeu Valentim acariciando a barriga de
Valkíria – E vai ter o amor necessário para ser alguém realizado e feliz por
suas escolhas. Vai poder ver a beleza onde nem sempre é tão belo assim!
-
E vai ter os pais mais dedicados que existem. Se depender de mim, será o melhor
ser humano deste planeta e desta galáxia! O meu filho perfeito e tão
desejado... Amo ele, mesmo não estando nos meus braços... E não tendo tanta
certeza assim da gravidez – Valkíria parecia embalar uma criança imaginária,
com os olhos reluzentes e um sorriso já maternal.
-
Temos que comemorar! A esta criança que está vindo para fortalecer ainda mais o
vínculo de vocês dois, a solteiridão do Júnior e a minha primeira exposição de
quadros... – disse Leo.
-
Ao futuro! – todos disseram, erguendo uma taça com suco de maçã para o alto.
Depois
de algumas músicas e mais conversas jogadas fora, Valkíria e Valentim voltaram
para casa, já era tarde e precisavam acordar cedo. Se despediram como de
costume, e saíram entre risadas e piadas feitas anteriormente.
Júnior
e Leo haviam decidido acabar com a bebida, já que Valkíria não bebeu e Valentim
tomou apenas uma cerveja. E eu como narradora, bebendo meu café forte, e
batendo as teclas da minha velha máquina de escrever. Até pensei: “como nós
escritores (se posso me autodenominar assim) somos tão enxeridos, nos
intrometendo nos assuntos alheios, pensando em coisas que não deveríamos. Pior
ainda, pensando várias vezes pelas pessoas da estória. Não cometemos equívocos
literários?”
-
Claro que cometem! – disse Júnior.
-
Não Júnior, eles já estão muito bem estruturados, e uma criança só vai
fortalecer ainda mais o amor dos dois. Não estão cometendo um erro...
Júnior
foi até a sacada com a bebida na mão, nunca gostou de ser contrariado. Se
deixou escapar dentro do mundo de seus pensamentos, não percebendo que Leo se
aproximava e observava seu rosto apático.
-
Não se preocupe. Você nunca vai ficar sozinho. Esse filho é muito importante
para ambos. Vai amadurecer a cabeça dos dois, vai mudar um pouco as coisas
entre todos nós, trazer um pouco a mais de vida após tudo que aconteceu com a
sua família!
-
É aquele medo, você sabe. De perder tudo isso... Vocês... E agora, estou
precisando de apoio. Quero decidir minha vida... O que vai acontecer de agora
em diante... E essa criança...
-
O que vai acontecer eu não sei. Nem sabia que um dia poderia amar a notícia que
o Valentim seria pai... E tudo isso sem me sentir deixado de lado, com os
sentimentos menosprezados e não realizados... Acabei dando seguimento, um pé
atrás do outro. E quando acordei havia acontecido tudo novamente. Por que seria
diferente com você?
-
Acontecido tudo novamente? – Júnior fixou sua atenção para estas palavras e se
voltou para Leo.
-
É. Amar outra pessoa novamente.
-
Até você se resolvendo e eu aqui com meus tantos dramas. E como gosto de fazer
drama!
-
Você não faz drama, você faz Wolf. É diferente... Além do que, não está nem um
pouco resolvido. Esse punhado de quadros é para ele. Esse sorriso no meu rosto
também. Mas não tenho tanta sorte assim. Ele não me quer como outra coisa. Ele
me quer como um amigo.
-
As coisas ficam complicadas, não é mesmo?
-
Sim. Desculpa se agi como um estranho nestes dias, não estava em mim... Mas
obrigado por me inspirar a conhecer um lado de mim que eu não conhecia. Sempre
lhe desejarei o melhor, você me fez parar de tomar remédios para dormir, se
posso lhe confessar. Muito obrigado! E acho você espetacular, do jeito que você
é! Nunca mude por ninguém...
-
Obrigado amigo, você também é super incrível, continue assim...
Mesmo
decepcionado com a resposta, esperando que Júnior fosse um pouco mais objetivo
sobre seus sentimentos, Leo acabou o convidando para a sua fuga pessoal dos
problemas, restabelecendo a continuidade da conversa:
-
Não quer fugir um pouco desta rotina diária? Respirar um ar puro, e amanhã ir
comigo para a casa de um amigo no meio do nada? Vai lhe fazer bem...
-
No meio do mato você quis dizer, não é? Sem celular e todas essas coisas? –
Júnior passava por um período de negação, sempre indo contra tudo.
-
Estarei indo amanhã no fim da tarde. Vou passar só o domingo por lá, enquanto
reformam a minha cozinha. Tenho que trabalhar na segunda. Se pensar um pouco
mais na ideia, só vir aqui perto das três da tarde – Leo nunca tinha sido bom
para insistir nas possibilidades, e Júnior se assustou um pouco com sua grosseria.
-
Ah! Sim – disse Júnior.
-
Não quero ir tão cedo e nem tão tarde. Quero pegar o pôr do sol do campo.
-
Vou pensar e qualquer coisa lhe aviso. Não seria uma má ideia fugir de tudo
isso. Mas por hoje preciso ir dormir, estou com muito sono. Lhe ajudo a arrumar
as coisas e vou para casa.
-
Sem problemas. Eu limpo amanhã de manhã...
-
Não, eu faço questão de ajudar. Até porque a ideia, dessa coisa de hoje foi
toda minha. Nada mais justo. E sobre amanhã, sabe que eu decido tudo em cima da
hora...
Júnior
ajudou Leo a limpar a bagunça, se despediu e foi para casa. Subiu dois andares
pensando no que havia acabado de ouvir: “ele estava amando outra pessoa”.
Leo
sentou no sofá da sala, ligou a televisão e chorou. Sabia que estava embarcando
sozinho, dentro de um sentimento que não teria mais volta. E amaria mesmo sem
ser amado. Elevaria Júnior ao patamar mais alto da sua existência, sacrificando
seu amor próprio por este sentimento. O amor sempre acabou sendo muita coisa na
sua vida, e agora Júnior também passava a ser. Júnior era um belo afresco de
tinta a óleo. Então parou de chorar e preparou os seus pincéis.
Depois
de toda infestação de lágrimas da madrugada, e da confirmação da gravidez de
Valkíria, Valentim resolveu preparar um grande almoço de comemoração e
inauguração da casa nova. Convidou Leonardo e os amigos mais próximos. Leo
pediu desculpas pelo telefone, passaria durante a semana para parabenizar o
casal e conhecer o novo espaço, estava atarefado em pleno sábado de meio dia.
Júnior
acordou com o barulho do telefone, ouviu da sala conversas aleatórias no
corredor e resolveu levantar, seu primeiro dia sozinho no apartamento. Colocou
qualquer roupa e se deparou com um punhado de pessoas buscando caixas na sala,
lembrou da mudança e do almoço em um sábado chuvoso fora de casa.
Depois
de ajudar a levar as coisas até a garagem, pegou carona e foi até a nova casa
de Valkíria. Eu também estava lá, fui convidada juntamente com meu filho
Carlos, que não pode aparecer por estar na casa de sua tia do interior (ele precisava
colocar a cabeça em ordem depois do fiasco em frente do condomínio). Resolvi
ir, pois Valkíria já era como alguém da minha família. Na sala haviam mais dois
casais, pelo que averiguei estudavam com Valkíria e Valentim, eram amigos de
curta data, mas muito simpáticos e afeiçoados.
-
Se conhecem há algum tempo? – pedi.
-
Sim. Não muito para falar a verdade. Mas tem como não gostar deles? – respondeu
a mais inquieta do grupo, com cabelo escuro e enrolado que ia até a altura dos
ombros.
Depois
do almoço se despedimos e fomos para casa, Valentim me acompanhou até a porta e
resolveu me dar carona, estava indo comprar tinta para acabar de pintar a sala.
A notícia que eles teriam um filho deixou todos animados, exceto Júnior, que
não conseguia disfarçar o incômodo que sentia pela confirmação da gravidez.
Valkíria, aproveitando que Valentim havia saído, sentou próxima do seu irmão,
sendo clara e direta como de costume:
-
Não está feliz com a minha gravidez por quê?
-
Oi? Quem disse isso?
-
Não tem como não perceber. Você não esconde nada de mim, se lembra? Eu que
disse para a mamãe que você era gay, ainda antes de você se assumir por
completo.
-
Sim... Sim... Não é não estar feliz. As coisas estão muito boas para todo
mundo. Mas tenho medo de perder tudo isso. Tenho medo de, sei lá...
-
Você nunca vai perder nada disso! Eu vou continuar sendo sua irmã, fazendo meus
shows no SeaWorld, Valentim continuará sendo o Romeu moderno, Leo o lobo
solitário. Todos sempre estaremos aqui... É novo tudo isso? Sim, é novo! Mas
não tenha medo de se permitir a viver novas felicidades, com novas pessoas, por
que não? Se permita a viver o que é bom!
-
Porque sei lá Valkíria. O mundo é tão grosseiro, é tão nojento e...
-
Não. Sem esse papo Júnior. O mundo é aquilo que você acha que ele é. Pode ser
um lugar espetacular, pode ser um lugar maravilhoso, um lugar onde as coisas
acontecem... Mas isso tudo só depende de uma coisa: da perspectiva que você
olha para ele. Então pare de ver problemas nas soluções! Pare de achar que as coisas
não estão dando certo! Olha para você: tão jovem, tão bonito, com pessoas que
lhe amam de verdade...
-
E se as coisas não derem certo para mim?
-
Já olhou para os lados! Você tem um teto sobre sua cabeça, faz o curso que
sempre sonhou na sua vida, tem liberdade para fazer e desfazer qualquer
coisa... Você é perfeito, você é um ser humano admirável! Não se limite dentro
deste pensamento do “e se...”
-
Quantas vezes já lhe disse que você tem razão?
-
Nenhuma, mas desta vez tenho. E quantas vezes ainda vou ter que dizer para você
perder o medo de ser feliz? Perder o medo de arriscar? Perder o medo de por
expectativas?
-
Estou feliz sim pelo seu filho ou filha, Valkíria...
-
Não é apenas meu!
-
E do Valentim, sim é claro. E realmente acho que só preciso por em ordem a
minha cabeça. Só preciso dar um tempo de tudo que me cerca, até de mim mesmo.
-
É bom às vezes fugir das coisas. Fugir sempre, é que se torna um equívoco.
-
Falando nisso, que horas são?
-
Duas e pouquinho.... Por quê?
-
Vou ir viajar com Leo. Espairecer um pouco e respirar ar puro. Pronto, está
decidido!
-
Sou totalmente a favor!
-
Quem sabe neste fim de semana fora, eu volte um pouco mais renovado!
-
Vocês dois tem tanto em comum. Vai fazer bem para você!
-
Vão pintar de que cor a parede da sala? – Júnior mudou de assunto.
-
Uma cor neutra. Nosso fim de semana vai render...
-
Se comportem... Não façam nada que eu não faria... Quer dizer, façam!
-
Bobinho... Não precisamos só disso não, viu? Só de estar perto dele já me sinto
muito realizada...
-
Ai que nojo! Vou arrumar algumas coisas rapidamente em casa e ir no Leo. Ele
disse três da tarde e já é quase isso! Vou mandar um recado avisando que ainda
estou aqui, assim me espera um pouco...
Júnior
arrumou uma pequena mala com suas coisas pessoais e duas mudas de roupa.
Cogitou em levar a sua câmera, mas desistiu da ideia. Precisava de um tempo
longe de seus projetos cinematográficos. Desceu até Leo que já o esperava na
sala, com as coisas arrumadas para partir.
Valentim
chegou com a tinta, entusiasmado com o passatempo da tarde, procurou Valkíria
para mostrar a cor que tinha comprado, ela estava na cama, deitada lendo um
livro.
-
E o Júnior?
-
Foi viajar, espairecer com o Léo em um sítio do interior. Léo está reformando a
cozinha se lembra? Ele disse que ia viajar...
-
Ah sim! O que você acha desta cor?
-
Bonita.
-
Quanto desânimo. O que aconteceu?
-
É o Júnior. Estou preocupada com ele.
-
Preocupada?
-
Ele não está bem. Depois do que aconteceu com meu pai, que ele se decepcionou
com o Carlos, ele não é mais o mesmo. Ele está precisando de ajuda.
-
Ele está crescendo, Valkíria. Ele está ficando mais velho, mais consciente da
vida. E é bom ele encarar um pouco esse lado trágico, você não acha? Não existe
nada que mude mais alguém do que a decepção. Viver em uma sociedade da comédia
é um crime. Ninguém precisa estar feliz o tempo todo...
-
Eu sei. É que pensava que ele estaria mais entusiasmado com a ideia de ser tio,
de ter uma criança pelo caminho, de ter um espaço só dele. Tenho medo que ele
se perca...
-
Não precisa ter medo. Alguém como ele até pode se perder, mas sempre acha a
rota novamente. Não existe nada neste mundo que apague o brilho do Júnior. Você
bem sabe disso. São muito parecidos. Ele vai aceitar este fato. Só está
decepcionado com a vida dele agora. Não significa que precise de ajuda, que
esteja mal. Acho que ele sente que irá perder um pouco da gente...
-
Sim, me disse isso hoje...
-
Ele vai se dar conta que não irá perder. Nós iremos continuar sendo as mesmas
pessoas, não iremos?
-
Claro que sim.
-
Nos amando desta mesma forma?
-
Sim. E de que outra forma poderíamos nos amar? Não existe um dia na minha vida
em que me arrependa do que nos aconteceu, desde aquele dia na academia.
-
Em que você veio brigar comigo?
-
Sim, e você estava com seu uniforme, com uma cara séria, e com um tênis que já
nem usa mais.
-
Estava?
-
Sim – ela respondeu sorrindo.
-
E não existe nenhum dia na minha vida que eu não queira estar do seu lado.
-
Eu sempre quis um filho, para mostrar para ele essas coisas boas que a vida
tem... Esses sentimentos que perduram anos e mais anos e não diminuem, a
felicidade de poder escolher uma cor para pintar a sala, da mesma forma que
observo seus olhos e me sinto segura. Me sinto livre para te amar da minha
forma. Sabendo que não preciso fazer seus caprichos, não preciso me submeter ao
que eu não quero. Posso sonhar, posso ser uma mulher realizada em casa, no
trabalho, no amor, na cama, na vida...
-
E eu te amo ainda mais por me aceitar na minha totalidade, sem perguntas e
questionamentos. Querendo estar com o Valentim que é correto, o Valentim que é
humano. Não com um Valentim que não existe...
-
Gosto do Valentim incorreto também... Gosto de ser a sua presa noturna... Gosto
até do inexistente em você.
-
Quem sabe você não é apenas minha presa, é também minha predadora e a minha
própria inexistência.
-
Olha o que você faz comigo... Fico com as pernas bambas... Idiota...
-
Hahahahahahahahaha... Evasiva...
-
Bem eu né Valentim? Bem eu...
-
Quero você para o resto da minha vida. Nem que minha vida acabe aqui e agora.
Tem certeza que nós não iremos mudar?
-
Posso garantir por mim que não. Não posso garantir por você nada.
-
Eu garanto também que não, meu amor. Vamos terminar de reformar a casa?
-
Vamos é reformar as nossas vidas!